sábado, 28 de novembro de 2009

O 's'

Eu nasci com um 'S' no final do meu sobrenome.

A burocracia, com o passar dos anos, comeu o meu 'S'.

E comeu o 'S' do sobrenome da minha mãe.

E comeu mais alguns 'Ss' que meus parentes ainda não descobriram.

E a ausência do meu 'S' está, hoje, transformando a minha vida num personagem Kafkiano.

Perdi a minha identidade, tirei outra.

Aí a burocracia devolveu o 'S' roubado da minha mãe.

E o 'S' ressuscitado da minha mãe passou a infernizar a minha vida.

E descobri, perplexo, que depois de tantos anos trabalhando, recebendo salário, pagando imposto, fazendo empréstimos eu não existo mais.

Fui abrir uma conta no banco: e eu, com minha identidade nova - com o 'S' ressuscitado da minha mãe - não existo mais pra Receita Federal.

Não posso abrir conta, não posso fazer crediário, não posso comprar um imóvel, não posso casar... não posso fazer nada... nem morrer!

O sistema só me reconhece com o 'S' roubado da minha mãe.

Com ele de volta me transformei num ser virtual, que só existe pra família e para os amigos.
Dizem que é fácil consertar.

É só devolver à Receita Federal o 'S' da minha mãe.

Mas tenho certeza que quando eu fizer isto alguém vai chiar.

Posso não receber o meu pagamento, posso não poder movimentar a minha conta que tem mais de 30 anos, posso ser preso indevidamente.

E tudo por conta de um pequenino 'S', de quem, por sinal, nem sou muito fã.

De uma coisa eu tenho certeza: este 'S' ainda vai dar muito que falar.

A burocracia é uma senhora muito cruel, lerda... e burra!

E mora no Brasil!

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TõeRoberto

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Adenaide Paixão

Ah, Adenaide Paixão, que mulher maravilhosa é você!

Levanta, faz o café, cuida dos meus filhos, limpa a casa, lava a roupa, passa a roupa, faz o almoço, o café da tarde, o jantar, o lanche da noite.

Você é uma máquina de fazer coisas.

Uma mulher desprovida do cansaço da vida.

À noite ainda me acolhe, rola comigo pela madrugada afora como uma adolescente em fogo.

Caralho, onde você arranja tanta energia para administrar a minha vida?

Que paixão absurda te impulsiona a ser uma escrava tão sorridente e despojada de tudo... até da sua vida?

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TõeRoberto

domingo, 22 de novembro de 2009

Ponto

És um ponto e um ponto basta
pra manter, perpetuar a vida
pois enquanto o tempo passa
e é em rugas revertido
brilha a estrela, renasce a lua
lá no meio do infinito.

És um ponto e um ponto basta
pra manter, perpetuar a vida
pois enquanto o tempo passa
pelas pernas enfraquecidas
no jeito de ser do universo
as coisas ficam esquecidas.

Acaba o ser
acaba a pedra
acaba o aço
morre o poeta
rasga-se o verso
acaba o lápis
mas fica na imagem
da folha
e no espaço
um ponto
a essência da vida.

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TõeRoberto-são paulo/sp-12novembro1974

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Nota de agradecimento

Uma pergunta, ou duas, ou três... ou mais:

Tá bem de saúde?

De amigos?

De amor?

De paciência?

De calma?

De perspectiva?

De planos?

De sonhos?

De leveza?

De pureza?

De sensibilidade?

De criatividade?

De consciência?

De sono?

De profissão?

De dinheiro?

Com o mundo?

Está bem com você?

Se beija de manhã, todos os dias, quando vai escovar os dentes?

Nas horas vagas bate uma bronhazinha pelos velhos tempos... pelos novos?

Ri diariamente?

Se sente importante?

Legal?

O rei/rainha da carne-seca?

O fodão/fodona?

Parabéns!

Você não precisa de psicólogo, psiquiatra... terapia.

Obrigado por ler o Falas da Boca.

Que vive te lembrando que você é o cara/a cara.

Obrigado por ser feliz!

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TõeRoberto

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Anitenízia Linalda

Eu, Anitenízia Linalda, comprei um par de ferraduras e vou te dar de presente!

Caralho, mulhé, do nada você parece uma potra furiosa!

É porrada pra todos os lados e nunca se sabe realmente os motivos das tuas neuras.

Você pisoteia a todos com as tuas palavras e depois finge que não é com você!

Vou te cravar as ferraduras nas patas, botar um bridão na tua boca, jogar um arreio nas tuas costas, vou te rasgar de esporas... e te marcar com o meu chicote.

Aí pode soltar a tua fúria - comigo cravado em cima do teu lombo!

Pelado!

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TõeRoberto

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Enquanto

Enquanto a gente se sentir com sangue
pros pastos fartos de megeras frias
enquanto a noite me deixar de lado
eu quero em tudo consagrar meu frio
deixando em tudo do que quero em mim
o sorriso de tudo que cair em si
no quarto triste a sorrir de mim.

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TõeRoberto-são paulo/sp-15abril1972

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Mané

Ontem, ao escovar os dentes, sorri!

Pra mim mesmo!

Parei e fiquei me observando - fundo - saca quando a gente olha fundo no fundo da gente?

Pois é, foi isso!

Não fiquei olhando o meu rosto, os olhos, a boca, o nariz, as orelhas; atravessei a fronteira entre o racional e o emocional e fui passear nas avenidas do meu ego, id, psique - e vou lá saber como se chama este troço das minhas coisas profundas?

Mas lá estava eu.

O meu profundo é tão raso, tão frágil.

Choro por qualquer coisa: ausência, mulher, futebol, poesia, música, pôr-do-sol, abandono, carência, indiferença, saudade, tristeza, alegria.

Ô sujeitinho inseguro!

Não sei como sobrevive neste mundo difícil.

Vive num tremendo cagaço.

Doença, morte, vida, dívidas, filhos, mulher.

Sofre por tudo, se fode por tudo.

O meu eu profundo é um Mané.

Saca um Mané?

Aquele babacão sem perspectiva, respeitador de leis, regras, compromissos, contratos.
O Manezão!

Eu tenho um Mané morando dentro de mim e não posso fazer nada!

Ainda bem que o dono da casa é TõeRoberto, o fodão, o gostosão, o racionalzão, o viciadão em ter razão em tudo.

E vive dando porrada no Mané, mas o Mané é mulher de malandro.

Apanha, apanha, apanha... e na calada da noite, em silêncio, passa a mão na bunda de TõeRoberto, o fodão.

E ele, quer dizer eu, ofereço a bunda e finjo, como sempre que comigo não, violão, pois este negócio de viadagem intrínseca é coisa de emo e de Mané enrustido.

E o meu Mané aflora, e se assume como Mané, mesmo contra a vontade de TõeRoberto, o fodão, que se acha o Deus dos imbecis metidos a besta.

Isto tudo só porque eu me olhei no espelho e fiquei curioso com as minhas profundidades que, afinal de contas, não são tão profundas assim.

Moro no raso da minha idiotice e o síndico é o Mané!

Irmão gêmeo do seu!

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TõeRoberto

sábado, 7 de novembro de 2009

Geringoncina Lavínia

Hoje, Geringoncina Lavínia, te vi na Praia de Pipa, de manhã, tomando sol naquele mar verde de doer os olhos.

Você me deixou sem palavras.

Você foi a responsável pelo fracasso da minha vida neste domingo de abril.

Mudo e besta fiquei desde o momento em que te vi... e as palavras ficaram presas no céu da boca, o ooohhh!!! na ponta da língua!

E a cabeça cheia de você!

Mais nada!

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TõeRoberto

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Eu adulto

Do eu adulto para o eu criança
quero fazer um verso da minha infância.

Vou usar certa discrepância
o rei perde a coroa, o reino, a felicidade
mas não perde a lança.

Eu canto o poema de toda a minha mudança
ergo os olhos, desenhos as imagens
dos risos, dos amores, das danças
depois me encolho, cubro a cabeça
fecho os olhos, choro, sonho,
eu adulto virando criança.

Tenho uma saudade guardada no guarda-roupa
e só a uso quando deito, penso, sonho
quando derramo lágrimas puras
inocentes, sentidas, sem mentiras
porque eu sou um adulto que faz um versol
embrando de todas as andanças
do tempo e do espaço
entre o eu tão homem e o eu tão criança.

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TõeRoberto-são paulo/sp-05agosto1974

domingo, 1 de novembro de 2009

Falência

Preciso de 1 milagre!

Preciso, com urgência, ganhar na mega-sena!

Sozinho, 50.000.000,00!

Ando 1/2 nervoso, remédio não adianta, e fiquei sabendo que 50.000.000,00 acalmam os nervos.

E quase dá pra me tornar um sujeito solvente.

Tem gente que tem crise de 1/2 idade, eu tô passando a crise da conta vermelha.

Eu quero azular a minha conta.

E na minha porta a fila cresce:

Visa, Credicard Caixa, Credicard Itaú, Mastercard, Americanas, C&a, Cheque especial, Imobiliária, Padaria, Mercadinho da esquina, Faculdade do filho, Faculdade da filha, Perua da Filha, Cheque pré-datado, Mecânico, Jardineiro, Pedreiro, Encanador, Eletricista, Prefeitura, Saelpa, Cagepa, Oi, Vigilância, Academia, Boteco da esquina, Amigos, etc, etc, etc... Uma legião de gente desalmada.

O que tá acontecendo com o mundo?

Daqui a pouco vão me cobrar pela emissão de carbono.

E pela utilização de oxigênio.

Não há dinheiro que chegue!

São 100 que entram, 200 que saem!

Preciso começar do zero, pra me adaptar ao mundo.

Melhor, quero começar com 9 zeros pra melhor me adaptar ao mundo.

Eu não quero ganhar na mega-sena, eu preciso ganhar na mega-sena!

Senão eu decreto a minha falência na segunda-feira!

E vou me mudar pra sua casa com a minha mulher, meus três filhos, a minha nora, a minha neta e os meus três poodles.

E a fila vai mudar pra porta da sua casa.

E eu vou morar embaixo da cama!

Da sua!!!

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TõeRoberto