segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Dor

Se ao menos o peito se abrisse
o sangue jorrasse feito água
se o médico operasse
e dentro encontrasse
algo concreto maciço
como o ferro, como aço.

Se ao menos quando ela incomodasse
a gente sem receio a pegasse
guardasse no bolso
para depois quando então
a vida nos entediasse
a gente novamente a pegasse
pusesse no peito
e esperasse.

Se ao menos ela não corresse
não sumisse
não fugisses
e ela fosse doída
como na carne a facada
se ela quando chegasse
desse autógrafo
beijo, abraços
e ela pudesse ser
pela máquina fotografada
para depois, amanhã
de manchete ser chamada.

Se ela ao menos chegasse
sozinha, com hora marcada
com horário pro café
pro almoço, pra dormir
eu a chamaria amiga
dava tudo, até de mim.

Se ao menos ela saísse
de fora do mundo pra dentro
se falasse
se chorasse
se sorrisse
se gritasse
se ela ao menos existisse
não fosse tão abstrata
não trouxesse no seu jeito
a vida toda enfeitada
ela seria mais bela
que a morte
sua comparsa.

.
TõeRoberto-são paulo/sp-30agosto1974

Nenhum comentário: